Posted in: "hyporadar" via Mélodie in Google Reader
Pierre Mounier, Institu Français, Lisboa, 11 Março 2013 Foto: Ana Carvalho
O francês Pierre Mounier (Centro para a Edição Electrónica Aberta – Cleo) esteve em Lisboa para falar de edição electrónica em acesso livre. Hoje os meios tradicionais de edição são confrontados com novas formas de divulgação e de uma maneira geral com uma mudança de paradigma à qual importa dar uma resposta. Ou seja, serão necessários reajustamentos às formas tradicionais de trabalhar com a edição de livros e com as publicações de uma forma geral. Mounier sublinhou grande parte dos problemas que afecta esta área, enquadrando teoricamente a discussão sobre o tema1. E falou de tendências como a “google generation”; a “tirania do impacto” das revistas científicas, e de um conjunto de ameaças ao sector livreiro, à edição, às bibliotecas…Entre as ameaças, por exemplo o aparecimento de outras formas de publicar através da internet: “Open Archiving”, blogues, Wikipédia e afins, Amazon, etc.
Num primeiro momento da apresentação de Mounier somos levados a crer que diante das ameaças à edição na sua forma tradicional a questão coloca-se: pode o livro acabar? Apesar da revolução que o universo da internet e de uma maneira geral as novas tecnologias proporcionam, o futuro ainda é dos livros, talvez não da forma como a temos conhecido, ou seja, a forma material como o livro se tem apresentado está a mudar. O que Mounier demonstrou foi a existência de novos padrões, apesar de permanecerem os espaços de conflito novas formas emergem.
E num ambiente que parece à partida hostil às tradicionais formas de trabalhar surge também um conjunto de novas possibilidades de trabalhar com o livro através da edição electrónica em acesso livre. Mounier deu vários exemplos no universo académico: Open Book Publishers (publicação de livros académicos em acesso aberto, com arbitragem científica; Reino Unido, desde 2008); Open Humanities Press (plataforma internacional em acesso aberto na área da teoria cultural, com vários jornais e colecções de livros, com arbitragem científica, desde 2008); Open Library Humanities (plataforma em acesso aberto no âmbito das ciências sociais e humanas, 2013); De Gruyter Open Acess (difusão de livros e outros conteúdos); Knowledge Unlatched (livros académicos); e o recém criado OpenEdition Books, uma plataforma de publicação de livros a acrescentar às já existentes no âmbito do projecto francês OpenEdition: revues.org (desde 1999), Calenda (desde 2000) e Hypotheses.org (desde 2008)2) (Em Portugal, existe já a LusOpenEdition que concentra as 3 plataformas referidas). Estes exemplos seguem, de certo modo, a tradição de edição e selecção científica, mas o modelo é transposto para o mundo digital.
Um outro exemplo referido foi Unglue.it, que através de crowdsourcing qualquer pessoa pode ajudar a publicar um ebook. Pensando no mundo dos museus, os exemplos deste tipo de estratégia já serão vários, mas recordo o caso recente do livro digital “Reprograme: Comunicação Branding e Cultura numa nova era de Museus” (coord. Luis Marcelo Mendes, 2012), em português e inglês, que foi editado também por via de crowdsourcing. Isto demonstra um pouco aquilo que a internet pode viabilizar. E neste sentido também, Mounier sublinhou a possibilidade de uma outra dimensão, a webification do livro, ou seja, a possibilidade do livro ganhar uma outra dimensão, por exemplo com a interacção dos leitores e a possibilidade de introdução de comentários. Nessa linha Mounier deu como exemplo a iniciativa Textus, que permite que estudantes e professores partilhem textos e trabalhem de forma colaborativa através desta plataforma.
Há, por outro lado, textos que ganham uma outra vida na internet, textos vários que são reunidos em livro como no projecto “Living Books about Life“. Um outro exemplo é Pressforward, que através da “Digital Humanities Now” recolhe textos dispersos na internet (em blogues por exemplo), com o crivo de editores científicos para compor números temáticos de um jornal digital. Além disso, já não são raras as vezes que textos na internet, como no caso dos textos de autor em blogues dão origem a livros impressos. Lembro, no caso dos museus, o livro de Maria Vlachou “Musing on Culture” (Bypass Editions, 2013) que nasceu do blogue com o mesmo nome (veja-se texto sobre o livro aqui).
E o que pode tudo isto interessar ao mundo dos museus? Na verdade, estas preocupações não são indiferentes ao campo da museologia: as publicações vão crescendo (livros, catálogos, etc.), os formatos já existentes de divulgação (revistas, boletins, etc.) também se vão transformando. Por exemplo no caso da MIDAS, uma nova revista de museologia com base em Portugal, as questões do acesso aberto e da sustentabilidade foram equacionadas já neste contexto de adaptação.
Por outro lado, há toda uma discussão mais alargada sobre as novas tecnologias e o potencial da internet na relação com os públicos que os museus não devem ignorar. Alguns dos tópicos enunciados por Mounier ao nível da transformação dos hábitos de consumo da cultura, sobre a forma como se acede à cultura, que também passa pela internet e pelo aparecimento de novos suportes, também são aspectos que devem interessar aos museus. Nesse sentido, museus e os profissionais da cultura em geral devem envolver-se e participar na discussão se pretendem desenvolver práticas relevantes na sociedade actual e sobretudo se pretendem comunicar para uma geração que acede à cultura de uma forma diferente das anteriores.
Alguns estudos foram citados: Donnat, Olivier (2009). Les pratiques culturelles des Français à l’ère numérique: Éléments de synthèse 1997-2008 (resumo do estudo). Paris: Ministère de la Culture et Communication. Disponível em: http://www.pratiquesculturelles.culture.gouv.fr/doc/08synthese.pdf; Carr, Nicholas (June 2008). Is google making us stoopid. In The Atlantic.
Hypotheses.org é uma plataforma de blogues francesa (agora também em Portugal aqui) que agrega blogues de investigadores no âmbito das ciências sociais e humanas. Muitos dos blogues pertencentes a esta plataforma têm a atribuição de ISSN depois de serem considerados relevantes do ponto de vista dos conteúdos produzidos por um comité científico (cf. texto sobre tema aqui